cartas que ele não lê


eu não desgrudo o pensamento das tardes em tua casa. 
o cheiro do pão no forno, 
o cheiro do bolo, 
o cheiro do sêmen impregnado no seu quarto de tatame. 
tudo misturado ao nosso perfume
que muitas vezes compartilhamos.

o teu cheiro permanece grudado em minha pele, 
nas minhas vestes, narinas 
e na minha memória que falha quando cismada faço birra.

eu fico pensando até onde chegamos sem romper, 
embora eu tenha ido tantas vezes,
e tantas vezes tenha voltado aos teus braços,
com a cara mais lavada possível.
e você tão corajoso ainda me abre as asas e um sorriso moleque, de quem não fez nada. 

isso quando não toca Der Kommissar, justamente naquele momento em que estou destilando... meu fel, meu veneno.
e rimos juntos de nossos teatrinhos sobre a cama.

ok, eu sei o quanto sou tóxica em minhas exigências banais, 
e me assusta pensar o dia que você se cansará disso tudo, 
mesmo com a sua parcela de toxidade fingidamente neutra.
ME ASSUSTA saber que não estou 100% limpa do meu acúmulo de vida 
pesada, plissada e engomada 
que me foi servida
(uma vida Líria),
uma vida quase sem lira.

é um estigma te amar quando não mereço ainda,
ou não reconheço a dádiva de te ter tão menino, 
ainda que soberano sobre minha carne, 
me pede para gemer baixinho.

longe tão perto 
agora está chovendo e hoje eu queria estrelas prateando minha noite de memórias.
bati um papo com Deus e de tudo que observei eu acabei entendendo...

"foi Deus que fez o amor...
foi Deus!"

mas somos nós que o limitamos.

rosangela a.


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