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Mostrando postagens de março, 2022

Cartas que ele não lê II

Amor, o amor é frágil, e toda robustez o sepulta. Nós vibramos na mesma escala com as cartas abertas sobre a mesa e a cama pronta pro embate. Nos equilibramos na mesma corda, bambos. Entre uma queda e outra nos seguramos. Faces opostas de uma mesma moeda, valores em alta, propensos a queda. Apertamos o nó da gravata ou do echarpe, sufocamos ao extremo,  nossas coleiras, domesticados. Depois desatamos o laço, fluidos emaranhados, não aceitamos a falta. Ainda agora percebi, segue-se novo desafio... Agora temos o uso obrigatório de máscaras  e você se nega a usá-las por puro disfarce. Preferes o muro interno que te protege? Nós dois estamos desfigurados!  Não percebestes? Nos falta confiar, e sem saber se devemos, perdemos a linha pelos infiltrados que não nos pertence, mas nos tira o foco. Uma hora o amor eclode/explode, vira correnteza e nos arrasta. Talvez nessa hora estaremos de mãos dadas... Talvez distantes, buscando a morte na completude entediante. O amor é um pêndulo no divã, sab

estilo cachorra

tem um medo na esquina para quem tem dedos frágeis tem uma lotação de mãos bobas da qual se foge enquanto se aguarda um vagão que acolha esse medo ele invade teu espaço e se senta ao lado pernas a roçar em teu fino vestido de seda desde a mais tenra idade se sabe do medo que assola a violação de ingenuidade tem um medo para cada uma, provavelmente vários um medo de que uma hora ou outra este medo, não nos dará chance de gritar - socorro! e sobre o medo que nos traumatiza digo que ainda que se apresse os passos as marcas desse medo nos vulgariza em palavras aos berros em outdoors, megafones charges vulgares "em nome da arte" homens gostam de mulheres cachorras depois as transformam em damas domesticadas mães para seus filhos e não mais às comem... às sepultam, em covas rasas ou às arrebentam de tiros mas você, nesse estilo Baby Beef não, vc está "limpinho" rosangela a.

1° pessoa

tentei escrever algo não biográfico nos olhos. usei lápis, rímel e delineador fininho, mas os olhos são tristes, b orrei tudo. tento escrever com os dedos  na boca, algo pornográfico. uma palavra que não babe, bem rouge,  feito para os lábios. corro para a ducha higiênica, caso escorra até a virilha... depois relaxadamente tragarei um cigarro... sem expectativas! cara lavada na varanda, apreciando a vista. rosangela a.

tarja preta

eu bem sei do tempo quando faz frio. ele me lembra os antissociais, dos loucos que não percebemos dia à dia. dos psicóticos de Lacan que param nas praças, dos neuróticos de Jung nas janelas, dos perdidos de Camus nas varandas. eles me lembram a hora dos ansiolíticos... o chuvisco me lembra o tiro no abdômen, da moça que pedia 1 Real ao moço na calçada no Rio. me lembra Alexandre Ivo que naquela noite fria em que não voltou para casa. do menino que ateou fogo no próprio corpo nas areias da praia de Gragoatá, após 6 meses de internação no hospício. eu bem sei do tempo quando faz frio... e bem sei do benzodiazepínico, o tarja preta na gaveta da cozinha. rosangelaa a. Ilustração Agnes Cecile

11/09/19

caminhar suave pela areia no fim do dia mirando as primeiras estrelas que despontam no céu de anil, mesmo com o rajado coral e lilás desaparecendo no horizonte. me assusta! algumas mentes estão estáticas assombradas pelo medo da revolução do tempo e esquecem a história do gigante colossal e talvez até a desconheçam. outras querem enfrentar a correnteza das ondas que as arrastam para o fundo. nossa terra teme o vermelho do sangue da madeira que queima na floresta. teme os ditos arruaceiros que enxergam no horizonte a democracia num navio que afunda a cada ato insano dos bajuladores insensatos do poder. me lanço a falar mesmo que em letras miúdas, para quem sabe ser ouvida. mas aqui ninguém me dá ouvidos. estamos todos dormentes? miseravelmente anestesiados, vemos a liberdade do' que nos representa, sem perceber o concreto armado, medonho dos soberanos para denegrir nossa estrela, e nos sepultarmos em novo golpe que armam em seus covis. e necessário ascender a brasa deste vermelho, a

trip

  a cada adeus, seguimos colecionando ausências e todo adeus leva um pouco da gente deixando saudade ainda que não suportemos mais a presença ao lado... saudade é a herança que fica no lugar do que se leva da gente a saudade te arrasta num vórtice de lembranças variadas enquanto se esquece o formato do nariz, a tonalidade da boca, aquele poro mais aberto gavetas são depósitos de saudades fotos amarelas, lembranças de viajens  tem a saudade palavra,  não dita, esquecida na boca contida no peito ...e só te cabe aceitar e ser grato um dia essa saudade será nossa marca neste mundo pois tudo vira saudade rosangela ataíde

mensagens para Ana

Ana, hoje descobri... somos forjadas para o controle. quando engravidamos e damos a luz, um bebê, logo iniciamos o processo de super controle o qual o retorno pode ser doloroso. logo que nosso bebê chora, corremos para controlá-lo (pode ser fome, fralda, dor), a nós cabe a função de controlar a situação... o bebê cresce um pouco e cabe a nós protegê-los de quedas, choques, acidentes em geral. essa é uma evolução do controle. mas é a vida, nossos filhos crescem, tornam-se independentes e não mais necessitam de nossa absoluta proteção. quem de nós consegue soltar as rédeas sem drama? rosangela a.

Berty mulher!

mulher! foi o tempo que te fez assim, sem as rédeas da vida que insistes em frear como se a guiasse sob um cabresto. um amontoado de emoções, conceitos, opiniões que sequer te pertencem em essência... tem certeza que quer batalhar? logo a vida mulher? esta insana, indomável prova de resistir, abrir mão, soltar, agarrar... logo os teus? bem sabes mulher que nada possuis além do seio de nutrir vidas, do colo de ninar, das mãos que acariciam, dos afetos em que se desdobra e morre por eles quando se doa os rins, o pulmão, o útero e até o esôfago... o coração? este nem conta, pois nunca te pertenceu embora te sabote batendo no peito enfarte. mulher não percebes, que és a soma de todos os amantes? todos os que sentiram teu ventre, lábio, seio, leite, o sangue na virilha... as unhas nude pale e o cheiro de seus cabelos. todos os importantes que abrigou em teu corpo!? todos os corpos onde pousou sua alma? e é verdade mulher, é justamente por saber que nem sempre fora açoite a mão que acaricia

a mente povoada não tem sossego algum

as palavras brotam e muitas vezes não sei o que fazer com elas uma árvore bailando ao vento já me causa reboliço; uma folha morta, volta a vida, ressuscita me causa uma gastura terrível, em compor algo explícito, indecoroso, sobre o piso lembrar pessoas, tempos, estadias, diálogos que imagino e nunca tive. nada me sai puro da lembrança e não tiro do pensamento a "coisa" até que a destrinche em palavras: a arranhe com vírgulas, a grite em caps lock, a grife de adjetivos mente povoada, estante de alegorias; cada tragédia em seu tempo, cada orgia em sua caixinha, cada objeto pelos ares, conversas insanas sobre vida, morte, libido. dormir, só depois das 3:30 quando os bichos sossegam, logo após 4 gotas, do benzodiazepínico ...mas confesso, às vezes durmo tranquila depois que transgrido as regras gramaticais, ortográficas, poéticas e torno público, esta gente toda, estas coisas todas. eu quase inteira. ou algo totalmente fictício. rosangela a.

Mãe de dois guris

olhar atenta a margem da página em branco enquanto o chá esfria, a criança no chão não perde tempo e se lambuza do desinfetante debaixo da pia. corro e grito socorro enquanto penso em afogar a criança. no hospital os doentes desfilam nádegas em camisolas azuis, os médicos cansados, anêmicos e famintos prescrevem receitas, alimentos, repouso que eles não praticam. volto para casa, a criança faz birra. amanhã o tempo finda. não li nada e não escrevi nenhuma linha. rosangela a.

pigmento

vejo  o mar em tom azul marinho. com reflexos do brilho lunar que se amplia em magnitude estelar vislumbro lá longe - bem longe - onde pousa o horizonte, uma traineira vagarosa que desliza serena nesta visão que tenho cismo: O que poderia eu fazer... para num mergulho noturno tornar-me sereia (bela como tal), fazer parte desse mar em fúria e cheio de vida? vou me despindo... a cada passo na areia, sinto o tato liquefato e frio que segue em arrepio até certo ponto tudo é certo, é ajustável, é controlável mas adiante, no mergulho contarei apenas com meus frágeis membros a incerteza de chegar ao fundo desse misto de céu e mar onde tudo é Todo e me farei Parte me assusta! é a sedução por estas cores que me conduz e me faz corajosa, neste caminho eu sou este oceano seja obscuro ou claridade azul celeste ou azul marinho revolto ou calmaria. sou pigmento deste azul que predomina o mundo! sou blue e liquida... muitas vezes sou Rio. sou Terra. sobretudo sou Mar! rosangela a. imagem: Disdis

Dança das Árvores

Passeio os olhos sobre as copas das árvores. O contorno exuberante bailando... Como um convite que acabo aceitando. Ouço uma canção xamânica e danço da varanda. quando chove deixo o som da natureza guiar os passos dos galhos. O vento forte, quase um tambor! É quando o baile se acelera e as sementes despencam para que venham outras bailarinas. Em lua cheia as folhas cintilam fazendo a noite brilhar inteira... Quando serena a madrugada, é como se elas se revestissem de um véu esbranquiçado, lindas, estão noivas! Os pássaros sempre voltam, seja verão, outono, inverno ou primavera. Fazem morada e depois partem e sempre levam um pouco delas. É curioso como algo tão fixo movimenta, não só os galhos ou as folhas... Mas a vida em várias formas. rosangela a.  

Mãe solteira/ Mãe solo

  "Ser solteira é um estado civil, que pode ou não ser conjugado com ser mãe. É um termo pejorativo, que leva a entender 'é mãe, mas não é casada'” Sexta-feira O calçado não quer mais calçar, O Mucilon não vai dar até o fim do dia Pedir no movimento para mim, não vai rolar A consulta de segunda está marcada, depois vem a receita E agora? E agora, tá na hora do corre pra escola Meu chinelo arrebentou na hora da saída, e rasgou minha unha que ficou em carne viva. Na queda apertei a mão com força, quase quebrei os dedos da guria para que ela não fugisse e atravessasse a rua e um carro a atingisse Vamos correndo para o banho e brincamos com a água debaixo do chuveiro Secar o menino, colocar a frauda que está o olho da cara... secar a menina, escovar a menina, prender os cabelos, olhar se ainda tem lêndeas e se tiver, arrancar todinhas Depois do almoço, correr para dona Zilá, a cuidadora dos guris No trabalho, chamada de vídeo - Mamã, eu te amo, faz coração com a mãozinha? ♡(ε&

"Feminicídio em Santa Teresa"

  Minha cara está em todos os jornais! — Você viu lá? Tinha um pixelizado horroroso que deixou escapar o cabo da faca que perfurou meu olho direito. Conheço bem aquele cabo, eu afiava com afinco e lavava todo dia aquela maldita. Uma faca limpa - diga-se de passagem. Com ela, eu costumava preparar a carne para o picadinho do João. Ganhei de presente de casamento. Sabe esses tradicionais faqueiros de presente de núpcias. — Sabe? Ainda bem que a latrina estava limpa, ainda bem que a casa estava caprichosamente faxinada naquele dia. Embora isso tenha dado maior destaque ao sangue que esguichou de meu corpo durante a carnificina, fico orgulhosa de ter deixado a casa limpa, sem uma louça suja sequer... A não ser, aquela faca maldita! Eu havia acabado de lavar o banheiro quando o João chegou muito silencioso e fedendo a catuaba. O João não era de bebida, também não era um homem silencioso. Mas não desconfiei de nada. Agora minha cara está em todos os jornais... — Você viu? Logo na página poli

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