a sagração do amor
tenho meu coração entregue
a ti pelas palavras.
como se o segurasse
na palmas das mãos, e ele
pulsasse por elas,
e como estou ao chão,
necessito cuidado para que ele
não se contamine neste solo
profano.
pois que sou verbal
e pouco importam os signos
aos quais recorro
nesta coreografia
de cali/grafias
onde pendem ao ar dizeres
que bailam
sobre meu desespero,
sobre meu desalento,
meu afeto,
e minha necessidade de estar em ti.
***
é pelo que somos,
[apenas pelo que somos
que essa expansão se dá
de início, dentro da pele,
tão carne e terrena
jogada neste solo fértil e repito profano,
a saltar para esta margem
sem sangue... éter
da escrita
quase esgrima
que se dá entre caracteres
é por sermos humanos,
[é por sermos vida
mesmo que nos percamos
pela vida inteira
e não possamos nos sentir
um pelo outro,
e sentir um pelo outro é
entender o que o outro sente.
é violentar o espaço sagrado
das emoções insurgentes
quando queremos fugir
ao verter sangue entre as pernas
ou lágrimas nos olhos másculos
(a vergonha de cada gênero)
e,
mesmo que seja a ausência
o que se sente,
sentir é
dentro da palavra amor...
o mais importante ato!
e essa ausência de nunca
nos sentirmos gozo,
talvez seja entender
o que um, e o outro
não se permitiu
sacrificar pelo amor da primavera
adormecida pelo sol infernal que nos aterroriza
e,
se fugir é não saber...
olhar ao lado e te sentir
— amparo!
olhar para frente e não te ver
— entregue!
olhar para o alto e não te ter,
— socorro!
olhar para baixo e não estar em tuas mãos
— crescente, pulsante, existência.
amor
te digo...
é sobre tocar...
e mais ainda sobre não tocar e
ainda sentir,
sentir é olhar para dentro e perceber o outro.
— ondas de choque...
possibilidades, potências,
respiro, movimento.
isso nos mostra que o respaldo para sentir,
não necessita, estar junto.
se sentir te afeta
mesmo que no limiar da existência...
ser afetado
é tudo que o corpo
deseja.
mas a repulsa causa medo
daquilo que desconhecemos.
se não estiveres distraído,
anestesiado
saberás do inferno e do limbo,
e saberás que o amor é o céu
por destino, norte!
como saber se é amor
o que sentes,
se não houver o encontro, a entrega?
— o amor é o que te dá vida
e te trouxe até aqui, para me ler inteira...
— porque amas?
— por que és amável?
"Se você quer entender, sinta..."
rosa ataíde
Nt: a fala entre aspas pertence a coreógrafa Pina Bausch 1940-2009.
Certamente a poesia em sua esfera dispensa explicações, mas como me inspirei em uma coreografia extremamente intensa como A Sagração da Primavera, digo que trouxe dela os seguintes recursos e estou aberta a dialogar sobre:
Canon;
Corpo e vigor;
Objeto (amor);
Sangue;
Sacrifício/pecado;
Pulsação;
Suspensão;
Relaxamento;
Terra;
Intensão/(s);
Não fechamento.
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