Hiperfoco

Dmitry Gorohovsky

continuo a fazer poemas às quatro da manhã,

até quando chove e teu rosto me vem,
e parece inundar de uma cor improvável a meia luz de meu quarto e suas esquinas sombrias...
os meus cantos, e minhas curvas de mistério.
eu poderia dormir e sonhar, eu poderia sair à rua e esperar o sol nascer e apreciar o espetáculo da vida inciar em novo dia, com os pássaros e seus sons de pássaros, a cigarra gritando no meu ouvido
-acorda!
mas estou mergulhada em palavras que descodifiquem tua tez, teu endereço universal, você que não sei.
acontece que não vou. acontece que não largo dessa luz de artifício. acontece que a noite é densa e não combina com o alvorecer e sua sonoridade. acontece que tem uma música ecoando no silêncio, e tem essa areia que escorre em fricção de corpos.
é como tentar entender a aurora boreal e ser lançada no Espaço com teus segredos... tão belo e ausente de sentidos.
arrisco uma escrita torta, que até parece fingida, mas que provoca antes de ser esquecida.
o poeta finge que finge para não ser condenado pelo o que delimita na escrita, mas como poetas sabemos... por mais expansivos que sejamos, ainda assim existe algo grande entre o tudo, no espaço que há entre uma nota e outra que antecede o refrão que não foi tocado e ficamos parados tentando captar em nossa limitação aquilo que não conseguimos ainda.
você parece uma música boa, que nunca escutei.
um pacto de silêncio, entre o cego e o surdo.

rosangela ataíde
também em @rosaataideart

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